
Na última semana, MC Daniel lançou marca e deu aula de branding em uma golada só. A divulgação da Goly foi puro suco (ou melhor, whisky) de conceito, posicionamento e estratégia. Em uma campanha intitulada “Break It to Make It”, musas da internet como Sílvia Braz, Lelê Burnier e Ana Paula Justus dividiram cena com nomes do trap e do funk, como Xamã, MC Livinho e o próprio MC Daniel. Juntos, literalmente quebraram uma barra de gelo gigante, transmitindo um claro conceito subversivo: aproximar o luxo da quebrada, o fino do funk, o verniz do visceral.
A Goly foi construída com uma narrativa paradoxal, onde o contraste não é ruído, é potência. Apenas dias depois do lançamento da marca, os produtos foram revelados: licor de melancia com hortelã e licor whisky com canela.
Cheers!
Havia desejo, faltava espelho
A campanha da Goly fala diretamente com um público que consome o som dos MCs, mas que nunca se viu representado nos comerciais da Johnnie Walker, Chivas ou Macallan. Havia uma lacuna de pertencimento simbólico; havia desejo, o que faltava era espelho.
Aparentemente a Goly é para quem está em busca de status aspiracional – mesmo que seja por uma noite, ou uma foto no story.
“Quebrar o gelo” foi uma metáfora inteligente que simboliza a aproximação entre classes, estilos de vida, referências e culturas. Afinal, há quem ouça Xamã enquanto segue a Sílvia Braz pelas fashion weeks mundo afora, via Instagram.
Dá pra “engolir” esse nome?
Se o posicionamento da marca foi um golaço, a escolha do nome dividiu opiniões. Muita gente achou Goly um nome ruim, “com cara de energético barato”. Mas como especialista em Naming, posso afirmar que vale a pena uma análise mais profunda.
Ainda que Sílvia Braz e Ana Paula Justus fossem parte do casting de estrelas da campanha, será mesmo que a marca foi feita para elas?
Goly tem sonoridade fácil, termina em -Y, recurso frequentemente usado por marcas populares que querem soar modernas e internacionais. É curto, sonoro e com potencial de viralização.
(Será que minha mãe usou a mesma estratégia ao me nomear? Risos!)
Goly não tem nada que comunique tradição ou herança internacional – pilares clássicos do branding de destilados de luxo. Não é um nome que você espera encontrar entre um Jackie Daniels e um Macallan. Ele soa mais como bebida pronta de geladeira de mercado, mais “no rolê” do que no minibar de hotel cinco estrelas.
E isso, na superfície, parece contradizer todo o conceito da campanha, que promoveu um encontro entre luxo e street. Como pode um nome tão popular sustentar uma campanha que também flerta com o universo premium?
Mas é aí que está o ponto de virada da análise: essa marca não foi criada para o Roberto Justus, marido da Ana Paula Justus, receber seus sócios em um jantar de negócios. A Goly é para quem admira o lifestyle da Ana Paula, mas se vê no palco com o MC Daniel.
Produto popular maquiado de premium, criado para quem consome whisky mais como um ato de status aspiracional do que para agradar o próprio paladar. O objetivo é sentir que ter algo em comum com quem se admira, mesmo que seja só por uma golada.
É aí que eu pontuo mais um gol da Goly: nome certo para o público certo!
Até o último gole
Talvez seja utópico acreditar que uma marca consiga, de fato, derreter o iceberg que separa mundos tão distintos, ou que a conexão entre as influencers e os MCs, resistirá após o desligar das câmeras. Mas não podemos negar que a publicidade sempre foi ferramenta poderosa para moldar a sociedade ao longo do tempo.
Se fiz a leitura certa, o propósito da marca é sobre “pertencimento” e não “herança”. Nesse caso, não há como mudar o passado, mas pode-se interpretar como o primeiro convite para que um público ocupe mesas, que até ontem pareciam estar reservadas a outro.
Desejo que cada vez mais a “presença”, finalmente servida, permaneça até o último gole.
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